Ritual

Ritual

Como a seleção trabalhou em estruturas cerebrais existentes, aumentando capacidades emocionais e interpessoais, algumas propensões a comportamentos de primatas começaram a evoluir. Entre elas estão: a habilidade de ler olhares e rostos e imitar gestos faciais, várias capacidades para sentir empatia, a habilidade de ficar emocionalmente excitado em contextos sociais, a capacidade de fazer rituais, um sentimento de reciprocidade e justiça e a habilidade de se enxergar como parte de um ambiente. Um aumento na paleta emocional disponível para os macacos resultaria em um aumento de todas essas capacidades comportamentais, segundo Turner.
Apesar de muitos, se não todos, desses comportamentos terem sido documentados em macacos, eu quero concentrar em dois deles - ritual e empatia - sem os quais a religião seria impensável.
Em uma gravação de arquivo, a primatologista e antropóloga Jane Goodal descreve a dança da cachoeira que foi observada em chimpanzés. Vale a pena citar seus comentários aqui:
"Quando os chimpanzés se aproximam, eles ouvem esse som estrondoso e você vê que seus cabelos ficam um pouco em pé e eles se movimentam com maior rapidez. Quando chegam lá, eles ficam se balançando ritmicamente, geralmente em pé, pegando pedras grandes e as jogando por uns 10 minutos. Às vezes, agarram cipós e se balançam até onde há borrifadas de água e eles ficam na água, que geralmente evitam. Depois, você os verá sentados em uma pedra que realmente fica na correnteza, olhando para cima, observando a água conforme ela cai e então assistindo a ela correr e desaparecer". Eu não consigo evitar a sensação de que essa dança é provocada pelo sentimento de reverência e espanto que sentimos."
O cérebro do chimpanzé é como o nosso: eles têm emoções que são claramente similares ou as mesmas que as que chamamos de felicidade, tristeza, medo, desespero e assim por diante - suas habilidades intelectuais incríveis que costumamos pensar que são únicas a nós. Então por que eles não teriam sentimentos de algum tipo de espiritualidade, que é se sentir impressionado por coisas maiores que você mesmo?
Goodall observou um fenômeno parecido acontecer durante uma chuva pesada. Essas observações levaram a pesquisadora a concluir que os chimpanzés são tão espirituais quanto nós. "Eles não conseguem analisar, não falam sobre, não podem descrever o que sentem. Mas você sente que está tudo trancado dentro deles e a única maneira de expressar isso é através dessa fantástica dança rítmica." Além dessas demonstrações que Goodall descreve, outros observaram demonstrações carnavalescas, sessões de bateria e vários rituais de gritos.
As origens do ritual estão no que Bellah chama de "brincadeira séria" - atividades feitas sem uma razão, que podem não servir imediatamente à sobrevivência, mas que têm "uma potencialidade muito grande de desenvolver mais capacidades". Esse ponto de vista se encaixa com várias teorias da ciência do desenvolvimento, que mostram que atividades de lazer são muitas vezes cruciais para o desenvolvimento de habilidades importantes como teoria da mente ou análise contrafactual.
A brincadeira, nesse sentido evolucionário, tem muitas características únicas: precisa ser perfomada "em um lugar relaxado" - quando o animal está alimentado e saudável e não estressado (por isso que é mais comum em espécies com maior cuidado parental). A brincadeira também acontece em saltos: tem um começo e um fim claros. Entre cachorros, por exemplo, a brincadeira é iniciada com uma reverência. A brincadeira envolve um senso de justiça, ou ao menos igualdade: animais grandes precisam se colocar em desvantagem para não machucar animais menores. Além disso, a brincadeira envolve o corpo.

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